Corpo são e alma doente: a crise espiritual das mulheres fortes
- Paola Mello
- há 3 dias
- 3 min de leitura
Você tem tudo. É reconhecida com o merecido rótulo de supermulher, é — de longe — a mais produtiva no seu meio, uma verdadeira equilibrista, interpretando milhares de papéis: a profissional de excelência, a boa mãe, a esposa disponível. Vai à academia, ajuda os filhos com a escola e ainda faz o que for preciso para o resto da família. É elogiada por todos. Mas, mesmo assim, sente que não é suficiente.
Você se sente improdutiva, cansada. Sua memória já não é a mesma. Por vezes, vem uma vontade de chorar, uma angústia, uma culpa difícil até de nomear. E ainda assim, você continua — fazendo o que deve ser feito.
Vivemos sob a tirania da performance. Redes sociais, métricas de produtividade e a lógica da comparação constante nos empurram para uma busca insaciável por sermos sempre mais: mais eficientes, mais bonitas, mais disponíveis, mais perfeitas. Mais… até que deixemos de ser nós mesmas.
O sucesso das canetas emagrecedoras, como Ozempic e Mounjaro, é, para mim, uma evidência anedótica dessa obsessão por atender a padrões que nem sempre correspondem aos nossos verdadeiros anseios — tentando alcançar o resultado sem trilhar o caminho que o sustenta.
Hoje, parecer saudável parece mais importante do que de fato ser saudável. Mais importante do que fazer o exercício é postar a foto dizendo que "o de hoje está pago". Academias lotadas, dietas da moda, aplicativos de monitoramento do sono, anéis e relógios que transformam até o repouso em objeto de medição — nada escapa ao imperativo da performance.
E não para por aí: nunca se buscou tanto alterar a própria aparência. Botox, preenchedores, harmonizações faciais levadas ao extremo — que, em muitos casos, resultam numa intrigante desarmonia. Uma coisa é querer envelhecer bem; outra, bem diferente, é desejar parecer quase outra pessoa.
Esse excesso não é saúde. É idolatria moderna: onde o culto é ao próprio corpo e o altar é o espelho. O verdadeiro ideal não é copiar um padrão inalcançável, mas tornar-se a nossa melhor versão — com dignidade, autenticidade e verdade.
Há uma contradição gritante nesse cenário: quanto mais tentamos parecer, ao invés de ser, mais adoecemos por dentro. Estamos ficando magras fisicamente, mas obesas mentalmente. A avalanche de métricas, análises, opiniões — nos deixa esgotadas. Não podemos desperdiçar um segundo: ouvimos um podcast enquanto dirigimos, uma aula enquanto escovamos os dentes e as notícias enquanto tomamos o café. Viramos escravas das notificações, que muitas vezes têm mais prioridade do que nossos maridos e filhos. A consequência?
Exaustão crônica, dificuldade de concentração e um cansaço que nem uma boa noite de sono consegue curar.
E, no entanto, o mal maior não está apenas na sobrecarga mental. O verdadeiro colapso é mais profundo: vivemos um raquitismo da alma.
Muitas mulheres já não sabem por que fazem o que fazem. Repetem padrões sem perceber, influenciadas por pessoas que sequer admirariam se as conhecessem pessoalmente. Há uma ausência de direção interior, como se a vida fosse apenas fluxo e imitação. O sentido real das coisas se perdeu, porque o foco está quase inteiramente nas coisas terrenas — no corpo, na aparência, no consumo — e pouca atenção é dada ao que realmente importa: qual o sentido de tudo isso?
Somos muito mais do que um corpo físico. Aliás, esta é justamente a parte mais perecível de nós. O que verdadeiramente nos molda como seres humanos é a capacidade de amar, de construir relações sinceras e profundas; é o tempo de contemplação, a criatividade, o silêncio fecundo, a espiritualidade. Tudo isso foi abandonado em nome de uma pressa que nos faz querer ser cópias — quando Deus nos criou para sermos originais.
Cada uma de nós recebeu talentos únicos e maravilhosos. Usá-los apenas para atender expectativas externas é uma forma sutil de desperdiçar o dom da própria vida. Só quando colocamos esses talentos a serviço do bem, da nossa vocação e dos que estão ao nosso redor, é que compreendemos o sentido maior da existência.
Não, você não está apenas cansada. Você está desorientada.Este é o famoso burnout.
E esse tipo de esgotamento não se cura com férias, meditação ou spa. Cura-se com verdade.
No fim, a questão não é apenas de saúde física ou de produtividade. É de sentido.A pergunta que se impõe é: queremos continuar a vencer no mundo às custas de perder a nós mesmas?
Talvez seja hora de inverter a lógica.Em vez de correr atrás de métricas que nos esvaziam, buscar práticas que nos elevem.Em vez de apenas medir passos, calorias ou horas de sono, cuidar daquilo que não pode ser quantificado: fé, virtude, presença.
Porque a verdadeira cura não virá quando estivermos com o corpo perfeito —mas quando tivermos a alma nutrida.